quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Há 30 anos morria Clodoaldo Teixeira. Publicado em O Nacional


Revolta dos Motoqueiros: hoje, 5 de fevereiro, faz 30 anos que o jovem Clodoaldo Teixeira morreu, aos 17 anos, em consequência de um tiro que levou de um policial militar após uma perseguição por ter fugido de uma barreira policial



Os anos de ditadura militar foram obscuros em muitos sentidos. Foram anos de cessação de liberdades, de controle da informação e repressão às manifestações populares. Mas mesmo que a comunidade de Passo Fundo não tenha figurado entre os principais combatentes contra a ditadura, pelo menos uma vez o povo saiu às ruas e se fez ouvir. A repercussão foi nacional e chegou a promover a troca de comando da Brigada Militar.
O estopim? A morte de um jovem, de 17 anos, que havia levado um tiro de um policial militar após ter fugido de uma barreira para averiguação de documentos. A comoção foi geral e estima-se que dez mil pessoas acompanharam o cortejo fúnebre e depois se mobilizaram em uma manifestação que é considerada a maior de Passo Fundo contra o regime militar: a Revolta dos Motoqueiros. A cidade que era conhecida na década de 1970 como a "Chicago dos Pampas" pelo alto índice de violência, voltou-se contra os órgãos de segurança.
"Nossa cidade era conhecida nos anos 1970 como a `Chicago dos Pampas` tal era o índice de violência que se registrava aqui, principalmente na periferia. A região próxima à Escola Estadual Adelino Pereira Simões, por exemplo, entre as vilas Nonoai e Operária era local de desova de corpos de criminosos mortos em desavenças com seus comparsas ou de vítimas da criminalidade. Formavam-se gangues dedicadas à violência. As pessoas que foram adultas naquela época devem lembrar-se da gangue do Jorge Cabeludo. As páginas dos jornais locais estampavam as fotos dos cadáveres que a polícia conseguia capturar ou de seus cadáveres.", relembra o professor de História e estudioso da Revolta dos Motoqueiros, André Martinelli Piasson.
O momentoSegundo Piasson, "em 1979, iniciou-se um novo momento na ditadura militar brasileira. A crise econômica fez brotar manifestações grevistas em todo o país. A insatisfação das classes médias era grande, pois os ganhos financeiros que a ditadura tinha permitido baixaram muito. Políticos, artistas e todos os que estavam exilados começaram a se manifestar mais abertamente contra o regime político brasileiro. E o governo teve que começar a fazer concessões", comenta.
Por outro lado, enquanto este era o cenário nacional, em Passo Fundo, a Revolta começava a acontecer, conforme conta Piasson no prefácio do livro Revolta dos Motoqueiros, de Leandro Malósi Doro:"Todas essas tensões ficaram bem visíveis em fevereiro de 1979. Naquele mês, no fim da tarde do dia 5, Clodoaldo Teixeira, rapaz de 17 anos, foi morto com um tiro nas costas em frente à garagem de sua casa, na vila Annes. Clodoaldo estava sendo perseguido por uma patrulha da Brigada Militar desde o centro da cidade. Em frente a sua casa, um dos policiais sacou do revólver e desferiu um tiro contra as costas do rapaz que se preparava para entrar em casa.
Segundo os policiais, Clodoaldo teria quase atropelado uma mulher e uma criança, jogado sua moto contra um dos policiais militares que tentava detê-lo e fugido, agredindo verbalmente os brigadianos. Segundo amigos e familiares, Clodoaldo, que era funcionário de uma mecânica de motos no centro da cidade, teria fugido por estar pilotando sem carteira.
A vizinhança revoltou-se e quase linchou um brigadiano que foi registrar a ocorrência. Amigos e conhecidos do rapaz, principalmente motociclistas, movimentaram-se durante toda à noite e boa parte da madrugada no centro da cidade. A associação de motociclistas da cidade - chamada Passo Fundo Moto Clube - levou seus integrantes às ruas e confeccionou cartazes com palavras de revolta e ofensa contra a Brigada Militar. Os manifestantes reuniram-se em frente à Delegacia de Polícia que conduziria a investigação e em frente ao quartel da Brigada Militar no bairro São Cristóvão. No quartel, o confronto com os brigadianos chegou a tal ponto que os policiais militares foram obrigados a criar barreiras armadas em frente ao prédio.
Em 6 de fevereiro, um cortejo com cerca de dez mil pessoas, acompanhado pelos pedestres que se aglomeravam à beira das calçadas, levou o corpo de Clodoaldo Teixeira ao cemitério da vila Petrópolis. A avenida Brasil, que atravessa a cidade, ficou tomada por pessoas, carros e motocicletas. Ao retornarem ao centro da cidade, pretendendo fazer manifestação semelhante a da noite anterior, os integrantes do cortejo encontraram as ruas de acesso à Praça Marechal Floriano fechadas por homens e viaturas da Brigada Militar. Com pedradas, os manifestantes forçaram os policiais a se retirarem para o CPA/3 (Comando de Policiamento de Área/3) que ficava em frente ao prédio da Antiga Prefeitura, também na região central de Passo Fundo. No confronto, os manifestantes tombaram uma viatura policial e atearam fogo nela.
No CPA/3, os manifestantes foram recebidos com tiros. Dois deles fizeram novas vítimas. Uma delas era Adão Faustino, de 19 anos, operário da construção civil. Por dias a família procurou o rapaz, descobrindo, finalmente, que ele era uma das pessoas mortas no confronto. A outra foi Joceli Joaquim Macedo, de 17 anos, funcionário de uma empresa de refrigerantes e que - por ironia do destino - era filho de um brigadiano da reserva. O prédio do CPA/3, que tinha a fachada coberta por vidros, foi apedrejado e a multidão só se acalmou quando o Exército interveio."


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